O projeto de lei que tramita no Congresso dos Estados Unidos e prevê a investigação do interesse da China no setor agrícola brasileiro foi relatado pelo senador do Partido Republicano Tom Cotton, que preside a Comissão de Inteligência do Senado americano.
De perfil conservador, eleito pelo estado do Arkansas e alinhado ao presidente Donald Trump, Cotton é crítico ferrenho do Partido Comunista Chinês, mantendo uma linha fortemente confrontadora ao país asiático, nos campos geopolítico, tecnológico e econômico.
Ele tem defendido a proibição de chineses estudarem em áreas sensíveis de ciência e tecnologia em instituições americanas e um plano de “desacoplamento econômico direcionado” com aumento de investimentos domésticos.
Também apoia a revogação do status da China de Transações Comerciais Mais Favorecidas permanentes dos Estados Unidos, defendendo renovações anuais, com a inclusão de critérios de direitos humanos.
Em fevereiro deste ano, lançou o livro Seven Things You Can’t Say About China (“Sete coisas que não se pode dizer sobre a China”), que entrou na lista de mais vendidos do New York Times.
Na obra, ele argumenta que o país asiático representa a maior ameaça à liberdade no mundo contemporâneo, descrevendo como o Partido Comunista Chinês se infiltra em diversas instituições americanas, incluindo Hollywood, Wall Street, universidades, mídia e política.
Na proposta do Intelligence Authorization Act para o ano fiscal de 2026, o senador propôs que os órgãos de inteligência do país, como a Agência Central de Inteligência (CIA) e a Agência de Segurança Nacional (NSA), investiguem o avanço da China no setor agrícola brasileiro e os impactos dos “investimentos ou do controle” chinês na cadeia de suprimentos, no mercado global e na segurança alimentar.
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O texto foi aprovado pela Comissão de Inteligência, que é composto de nove parlamentares republicanos e oito democratas. Ainda precisa ser analisado pelo plenário do Senado e pela Câmara dos Representantes antes de seguir para a sanção de Trump.
“Gostaria de agradecer aos meus colegas pelo trabalho incansável neste projeto de lei, que contribuirá significativamente para manter os Estados Unidos mais seguros e tornar as agências de inteligência encarregadas de tal tarefa mais transparentes e eficientes”, declarou Cotton após a aprovação pelo colegiado que preside.
“Este projeto de lei foi aprovado pela comissão em caráter bipartidário e espero que meus colegas apoiem sua aprovação pelo plenário do Senado.”
“Lula é crítico, se não abertamente hostil, aos Estados Unidos”, disse senador
O senador já havia demonstrado anteriormente preocupação com a relação entre China e Brasil. Em abril de 2023, durante participação no programa Hannity, da Fox News, ele criticou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por estar aproximando o Brasil da China.
“Ele é de esquerda. Ele é crítico, se não abertamente hostil, aos Estados Unidos”, disse o senador.
Na época, Cotton disse que Lula é o “típico líder de esquerda que chegou ao poder nos últimos anos na América Latina” sem que o então presidente, Joe Biden, do Partido Democrata, tenha dito uma palavra negativa sobre ele.
No programa, o senador atribuiu à “incompetência” de Biden a formação de “um eixo do mal cada vez mais centrado em Pequim”. “Está surgindo em grande parte devido à fraqueza do presidente Joe Biden e sua tendência de culpar primeiro os Estados Unidos e nossos aliados”, disse.
Para o legislador, a fraqueza da administração do então mandatário estaria levando países tradicionalmente alinhados aos Estados Unidos a se voltarem para a China, citando, além do Brasil, Emirados Árabes Unidos, Irã e Arábia Saudita.
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Em julho, defendeu a política de Trump de impor barreiras tarifárias sobre produtos importados, como forma de proteger a produção interna, particularmente de agricultores de seu estados, responsável por mais de 40% da produção de arroz dos Estados Unidos, segundo a federação americana do setor.
“O presidente Trump está usando tarifas para alcançar importantes objetivos comerciais nacionais, como encontrar novos mercados para os produtores de arroz do Arkansas”, escreveu no X.
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Senador quer proibir posse de terras americanas por chineses
Cotton nasceu em 1977 e cresceu em uma fazenda de gado no Condado de Yell, no Arkansas. Formado em direito pela Universidade de Harvard, trabalhou como assistente jurídico do Tribunal de Apelações Estados Unidos e exerceu a advocacia em um escritório particular.
Em 2004, alistou-se no exército americano, servindo no Afeganistão e no Iraque, até entrar para a reserva, em 2009.
Em 2012, foi eleito membro da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos e, em 2014, venceu a eleição para o Senado pelo Arkansas derrotando o democrata Mark Pryor.
Sua atuação anti-China sempre esteve em evidência. Em agosto de 2022, com o também republicano Tommy Tuberville, apresentou um projeto de lei para proibir membros do Partido Comunista Chinês de adquirir terras nos Estados Unidos.
No texto, os senadores justificam a proposta baseados em preocupações com segurança alimentar e riscos de espionagem em locais próximos a bases militares e de infraestrutura estratégica.
A proposta chegou a ser encaminhada para a Comissão de Relações Exteriores do Senado mas não avançou.
No ano seguinte, Cotton propôs outra legislação, ampliando o escopo do projeto anterior e proibindo qualquer cidadão ou instituição da China, ou qualquer pessoa agindo em nome de chineses, de comprar propriedades públicas ou privadas nos Estados Unidos.
Além disso, o texto autoriza o presidente a exigir a venda de imóveis que já estejam em nome de chineses “que representem ameaça à segurança nacional”. As exceções à restrição seriam refugiados, asilados e residentes permanentes legais.
Segundo Cotton, “o Partido Comunista Chinês tem engolido fazendas e imóveis americanos” e isso representa ameaças estratégicas e de segurança ao país.
O projeto, que também não avançou em 2023, foi reapresentado no Senado em janeiro deste ano, após a posse de Trump em seu segundo mandato presidencial.
Trata-se de uma versão federal de uma legislação já aprovada e em vigor no Arkansas desde 2023. A lei estadual proíbe que empresas com vínculos com partidos estrangeiros “inimigos” dos Estados Unidos adquiram ou mantenham qualquer imóvel, rural ou urbano, no estado — seja diretamente ou por meio de afiliadas.
O texto foi sancionado pela governadora Sarah Huckabee Sanders, também do Partido Republicano e bastante próxima de Cotton – ela foi assessora do senador na campanha de 2014 e ambos discursaram juntos na Convenção Nacional Republicana de 2024.
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Em maio deste ano, Cotton apresentou o ainda uma proposta exigindo mecanismos de rastreamento e sistemas de fiscalização em chips de IA exportados, com o objetivo explícito de impedir o acesso não autorizado, sobretudo por parte da China.
Recentemente tem feito duras críticas à fabricante de processadores Intel após a empresa nomear o chinês Lip-Bu Tan como CEO, em março deste ano. Ele acusa o executivo de investir US$ 200 milhões em empresas chinesas, inclusive algumas que teriam ligação ao Exército de Libertação Popular, força armada oficial da China.
No mês passado, o senador enviou uma carta ao secretário de Defesa dos Estados Unidos, Pete Hegseth, abordando a contratação, pela Microsoft, de engenheiros baseados na China em contratos de manutenção dos sistemas de computação em nuvem do Departamento de Defesa.
Em resposta, o Pentágono iniciou uma revisão de emergência de duas semanas em seus contratos em nuvem, para detectar e eliminar práticas semelhantes em outros fornecedores. Dias depois, a Microsoft anunciou que não utilizaria mais engenheiros na China para dar suporte aos sistemas do Departamento de Defesa.
Na semana passada, Cotton elevou ainda mais o tom, exigindo que o Pentágono proíba completamente o acesso de não-cidadãos estadunidenses aos sistemas sensíveis de defesa, independentemente de supervisão ou credenciais.
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