Revisão do IOF pode destravar combate a privilégios, mas levar a cortes sociais – Brasil de Fato

A revisão do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) prometida pelo governo federal abriu a possibilidade para a discussão de “medidas estruturais” sobre as contas públicas, de acordo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Feita em conjunto com o Congresso Nacional, o debate pode destravar o combate aos privilégios concedidos pelo Estado, mas acabar em cortes em programas sociais para que os gastos de 2025 caibam no Orçamento mesmo sem alta de tributos.

Hoje, o governo precisa de R$ 20,5 bilhões para conseguir equilibrar as despesas já programadas para este ano com a arrecadação de impostos prevista. Por conta disso, houve o anúncio de um aumento do IOF sobre operações de crédito para empresas, sobre o câmbio e sobre aportes de mais de R$ 50 mil em planos de previdência privada.

O anúncio, porém, gerou uma crise. Empresários e parlamentares reclamaram da medida. Líderes do Congresso Nacional viram nas queixas um risco de que o decreto do governo sobre o IOF fosse anulado por deputados e senadores.

O governo, então, resolveu abrir uma discussão sobre alternativas ao aumento do imposto. Essas medidas foram apresentadas por Haddad aos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), na terça-feira (3). Elas devem ser divulgadas no domingo (8), após uma reunião com outros parlamentares. Alcolumbre já adiantou que elas não serão focadas numa só solução.

“Não dá para tratar isoladamente o problema que nós estamos vivendo nas contas públicas do Brasil”, declarou o presidente do Senado, após o encontro com Haddad.

O ministro já disse que elabora uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) e um projeto de lei (PL) “relativamente amplo” para evitar que o imposto seja elevado.

Combate aos privilégios

Em meio às discussões, surgem notícias sobre as alternativas disponíveis. Parte delas tem a ver com corte de privilégios que o Estado brasileiro concede a determinadas categorias, setores econômicos ou empresas.

Este governo já encaminhou ao Congresso propostas para estipular que militares só possam se aposentar após completarem 55 anos e para endurecer regras sobre pagamento de salários de todos os servidores públicos do país, evitando assim que eles recebam mensalmente uma quantia acima do teto constitucional, hoje em R$ 46.366,19. Essas medidas não avançaram no Congresso. Podem avançar agora.

O governo também tentou reduzir os benefícios fiscais dados a empresas, extinguindo a chamada desoneração da folha de pagamento. O Congresso barrou a iniciativa. É possível que essa medida volte a ser discutida como uma alternativa ao IOF.

Para Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), todas essas medidas seriam benéficas. Ele, porém, tem dúvidas de que o Congresso Nacional as aceitaria.

“Na realidade, o Brasil elegeu um Congresso de direita e um governo de centro-esquerda, mas que fica refém do Congresso”, disse ele, ao Brasil de Fato.

Marcelo Lettieri, auditor-fiscal e diretor de comunicação do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional), também vê grande resistência de parlamentares a essa medida. Ele, aliás, disse que o aumento do IOF só recebeu as críticas que recebeu de parlamentares por conta do perfil de atuação deles. “A defesa do Congresso é sempre a defesa dos rentistas”, afirmou.

Corte no social

Por essas razões, Weiss vê riscos de cortes em programas sociais motivados pela discussão do IOF. Já foram noticiadas ideias para interrupção de aumentos dos aportes federais no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), um novo endurecimento das regras para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e até mudanças nos pisos de investimentos da Saúde e Educação. “Essas medidas são negativas”, disse Weiss.

“Acabar com o piso para a Saúde e Educação seria péssimo”, acrescentou Grazielle David, pesquisadora do grupo Transforma, sediado no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “O Fundeb estar em risco é assustador.”

Alternativas

O economista David Deccache, assessor do Psol na Câmara dos Deputados, também teme pelos rumos da discussão sobre alternativas ao IOF. Para ele, aliás, a única alternativa do governo seria mudar suas metas fiscais e alterar as regras do arcabouço fiscal para que não ficasse eternamente obrigado a cortar gastos.

“A solução é rever a meta de primário para o curtíssimo prazo. A longo prazo, tirar o teto [previsto no arcabouço]. Esse deve ser o debate”, disse ele.

José Luis Oreiro, economista e professor da Universidade de Brasília (UnB), foi contra o aumento do IOF desde seu anúncio. Para ele, se o Brasil precisa mesmo arrecadar no curto prazo, deveria elevar tributos sobre o Estados Unidos, que taxou o aço nacional.

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