Projeto do Congresso sobre emendas tem brechas para manter padrinhos ocultos – Política – CartaCapital

O anteprojeto do Congresso Nacional que promete dar mais transparência às emendas parlamentares e deve ser votado nesta quinta-feira 13 tem uma brecha que, na prática, pode manter ocultos os padrinhos dos repasses. Essa manobra envolve a destinação das emendas de comissão.

De autoria do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), o texto é fruto do acordo costurado com o Supremo Tribunal Federal para encerrar o impasse em torno das emendas. Em agosto passado, o ministro Flávio Dino suspendeu as transferências das verbas até a adoção de novas regras de transparência e rastreabilidade.

A proposta ainda não foi protocolada formalmente, de modo que é possível alterar os pontos problemáticos. Mas a minuta disponibilizada aos congressistas nesta quarta-feira, à qual CartaCapital teve acesso, permite que os parlamentares façam indicações por meio de suas bancadas partidárias, constando apenas a assinatura do líder da sigla.

Ou seja, por essa previsão, o autor original da verba não seria conhecido. Em um primeiro momento, o anteprojeto exige a identificação, em cada emenda, dos parlamentares que compõem as comissões temáticas. Contudo, libera as indicações por meio das bancadas, exigindo apenas a assinatura “pelos líderes partidários” e informações básicas sobre a verba.

Por meio de um formulário, os representantes das bancadas terão de fornecer dados como município e CNPJ do favorecido, valor, beneficiário final, código da emenda e código da ação orçamentária que ela representa. Não se exige, portanto, que o padrinho original da emenda apareça no documento.

Turbinadas após o STF declarar a inconstitucionalidade do orçamento secreto, as emendas de comissão estão no centro do que Dino considerou uma “balbúrdia” no Orçamento da União. Após o julgamento no tribunal, os congressistas passaram a utilizar os recursos dos colegiados temáticos para direcionar dinheiro a seus redutos eleitorais, sem a identificação dos autores.

O magistrado, então, cobrou mais transparência e exigiu que as indicações passassem por votação nos colegiados. Ele também criticou o mecanismo por transformar emendas de comissão em “emendas de líderes partidários”, uma vez que estes eram os únicos nomes que apareciam nos registros oficiais.

Ainda assim, o então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), driblou a determinação para que não houvesse votação e para que as indicações fossem assinadas em conjunto pelos líderes da Câmara, mais uma vez escondendo os autores originais. Foi o estopim da tensão entre Legislativo e Judiciário, mesmo após terem chegado a um consenso sobre as emendas.

Na ocasião, Dino não apenas mandou anular os efeitos de um ofício sigiloso assinado por 17 líderes partidários com a inclusão direta de 5.449 indicações de emendas que não têm registro em atas nem passaram por deliberação formal (ao todo, as indicações representariam 4,2 bilhões de reais). O ministro determinou que a Polícia Federal investigasse o caso por suposto peculato.

Outro ponto polêmico do anteprojeto é a criação de uma Secretaria Especial do Orçamento, que trabalhará no assessoramento dos parlamentares sobre o tema. Não há detalhes sobre a formação do órgão nem a quem ele estará subordinado.

Na prática, a secretaria deve esvaziar a atual consultoria especializada no assunto, que hoje atua na produção de pareceres técnicos para os congressistas, alguns deles críticos aos projetos em discussão no Congresso. Entre servidores, há o temor de que os integrantes do órgão sejam guiados por interesses políticos.

Sob reserva, um técnico do Senado com mais de duas décadas na Casa disse à reportagem que a criação da secretaria é um retrocesso institucional e lembrou que as atuais consultorias do Congresso surgiram justamente em resposta ao escândalo dos Anões do Orçamento, no qual políticos burlavam o Orçamento da União para engordar suas contas bancárias.

“A pretensa secretaria especial prevista definiria o que pode ou não ser publicado ou divulgado em termos de dados”, pontua o servidor.

Entidades como a ONG Transparência Brasil também veem com reservas a criação da secretaria, por considerarem que o órgão escanteará “a atuação das consultorias técnicas de orçamento da Câmara e do Senado, podendo criar empecilhos à divulgação de informações a respeito do Orçamento”.

Repost

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *