O primeiro-ministro francês, Sébastien Lecornu, propôs nesta terça-feira 14 ao Parlamento suspender a impopular reforma da previdência de 2023 até a próxima eleição presidencial, prevista para 2027, para superar a profunda crise política que abala a França.
A suspensão desta reforma era uma das linhas vermelhas da oposição socialista para não somar seus votos aos do restante da esquerda e da extrema-direita para derrubar o terceiro governo do presidente Emmanuel Macron em menos de um ano.
“Proporei ao Parlamento neste outono [primavera no Brasil] suspender a reforma previdenciária de 2023 até a eleição presidencial”, afirmou o premiê durante seu primeiro discurso de política geral perante os deputados.
O aumento da idade da aposentadoria de 62 para 64 anos até 2030 e o aumento para 43 anos, a partir de 2027, do período de contribuição obrigatória para uma aposentadoria integral cristalizaram o descontentamento com as políticas do presidente de centro-direita desde 2023.
A esquerda fez campanha pela sua revogação durante as legislativas antecipadas de 2024, que provocaram a atual crise política ao deixar uma Assembleia Nacional (câmara baixa) sem maiorias e dividida em três blocos: esquerda, centro-direita e extrema-direita.
Os socialistas haviam pedido a suspensão da reforma para não derrubar Lecornu. Duas moções de censura, apresentadas pela esquerda radical e pela extrema-direita, serão debatidas na quinta-feira e, se aprovadas, Macron advertiu nesta terça-feira que haverá uma antecipação eleitoral.
Enquanto espera a resposta dos socialistas, o líder comunista Fabien Roussel comemorou “uma primeira vitória”, enquanto o líder da esquerda radical A França Insubmissa, Manuel Bompard, denunciou que Lecornu estava simplesmente ganhando tempo e instou a censurá-lo.
A suspensão da reforma da previdência divide a base governista. O presidente, que a impôs por decreto, havia recusado até o momento ceder a esta reivindicação que a oposição de esquerda e os sindicatos vinham pedindo há mais de dois anos.
O recém-coroado Prêmio Nobel de Economia, Philippe Aghion, chegou a pedir um acordo sobre a suspensão da reforma da previdência para evitar o “perigo” de o partido de extrema-direita de Marine Le Pen, que lidera as pesquisas, chegar ao poder.
Compensar
Lecornu, de 39 anos, destacou que não haverá nenhum atraso na idade “até janeiro de 2028”, como solicitado pelo principal sindicato francês CFDT, e a duração da contribuição também permanecerá congelada em “170 trimestres até janeiro de 2028”.
No entanto, em um momento em que a segunda economia da UE está sob pressão para reduzir sua elevada dívida pública (115,8% do PIB) e para levar o nível de déficit público abaixo de 5% do PIB em 2026, ele alertou que a suspensão terá um custo.
Essa medida, que beneficiará 3,5 milhões de franceses, custará “400 milhões de euros” (2,5 bilhões de reais) em 2026 e “1,8 bilhão” de euros (11,3 bilhões de reais) em 2027, destacou Lecornu, alertando que deverá ser “compensada com economias”.
Seu anúncio chega horas após a apresentação de seu projeto de orçamento para 2026, que prevê um esforço fiscal de 30 bilhões de euros (190 bilhões de reais), em grande parte devido a uma redução nos gastos públicos.
Lecornu, que se autodefine como um ‘monge soldado’, também respondeu a outras demandas dos socialistas, como a renúncia de adotar os orçamentos e as leis sem o voto do Parlamento, como permite a lei, e abriu a porta para medidas de justiça fiscal.
A oposição socialista reivindicava maior taxação sobre os super-ricos com a introdução de várias medidas, como a chamada ‘taxa Zucman’, que consiste em impor 2% anuais sobre patrimônios superiores a 100 milhões de euros (630 milhões de reais).
O primeiro-ministro já rejeitou essa taxa, mas em uma tentativa de se aproximar dos socialistas, seu projeto prevê prolongar a contribuição excepcional sobre os lucros das grandes empresas e sobre as grandes fortunas, entre outras medidas.