O acordo entre Mattel e OpenAI não é brincadeira – CartaCapital

A Mattel e a OpenAI firmaram um acordo para o desenvolvimento de brinquedos inteligentes. A notícia correu o mundo, e a primeira leitura é de que a empresa colocará a inteligência artificial em produtos que já existem. Mas tudo indica que será muito mais, e  a parceria pode inaugurar um novo salto na indústria de brinquedos e entretenimento.

Os brinquedos com inteligência artificial já são uma realidade. Existem várias marcas no mundo, inclusive comercializados no Brasil. Uma delas é a Miko, que tem produtos como tabuleiros de xadrez e pequenos robôs divertidos, parecidos com personagens de desenhos animados, nas versões Miko Mini e Miko 3. Ambos conversam, ajudam em tarefas da escola, desenvolvem brincadeiras. Assinando o pacote Miko Max, os brinquedos permitem a utilização de pacotes de produtores de conteúdos infantis e fazem um acompanhamento da evolução da criança, quase um professor particular. No Brasil, é possível comprar um Miko Mini por cerca de 1.500 reais.

Se a produção de brinquedos com inteligência artificial já é uma realidade, qual a diferença no acordo entre a Mattel e a OpenAI? A primeira é uma definição: a Mattel não é uma empresa de brinquedos, mas um negócio de entretenimento com gestão de marcas. Nascida em 1945, acertou em cheio o mercado quando criou, em 1959, a Barbie. O sucesso veio da possibilidade de ser um brinquedo interativo e adaptável. As bonecas, claro, já existiam. Mas a Barbie incorporou adereços e situações, fazendo com que pudesse “viver várias vidas.” Além da Barbie, a empresa lançou os carrinhos Hot Wheels e Matchbox, as bonecas Monster High e Polly e os bonecos Max Steel e de lutadores do WWE.

Em paralelo a empresa desenvolveu um instrumento de promoção de seus produtos entrando em entretenimento. Criou uma estrutura para investir e produzir desenhos animados. Foi a responsável por sucessos como He-Man, She-Ra e muitos outros. Desde 1983, produziu mais de 25 séries e filmes, até chegar no sucesso de Barbie nos cinemas. E prepara mais uma dezena de filmes. Estas iniciativas deixam claro que reduzir a Mattel a uma fabricante de brinquedos é um erro.

O negócio da Mattel precisa de um empurrão, principalmente após um primeiro trimestre de dificuldades, quando seu prejuízo cresceu 42,4% em comparação com o mesmo período de 2024, chegando a 40,3 milhões de dólares, embora a receita tenha crescido 2,6%.

A OpenAI tem se estruturado para avançar em produtos. Recentemente adquiriu a startup de hardware Jony Ive, responsável pelo design de iPhone, iPad e Apple Watch. Com Jony veio uma equipe de engenheiros que já foi da Apple, o que pode indicar que, além da inteligência artificial, a Mattel tenha mirado na inteligência de desenvolvimento de produtos e interatividade favorecida pelo DNA da instituição, marca registrada da Apple.

A união das duas empresas parece perfeita em vários sentidos. A OpenAI é uma companhia de tecnologia e seus negócios circulam no ambiente digital. Criar uma estrutura em que eles cheguem nas mãos dos consumidores levaria tempo. A Mattel tem subsidiárias em 35 países, mas seus produtos chegam a mais de 150 nações. A rede de distribuição é enorme.

A criação de entretenimento com inteligência artificial usa os brinquedos como interface. A possibilidade de esses brinquedos serem incorporados a outras tarefas além de brincar — estudar, por exemplo —, cria um uso diferenciado que pode agradar os pais, convencendo-os de comprar os produtos. Vale lembrar que estamos em um momento em que celulares e tablets se tornaram membros das famílias, usados para “acalmar e distrair” as crianças.

A inteligência artificial acoplada a produtos leva a uma série de análises de comportamento, orientando novos produtos, criando um movimento de retroalimentação. Isso não é novo. Os celulares fazem exatamente isso. No entanto, com brinquedos, isso começará a acontecer muito mais cedo. Será uma pesquisa orientativa, por exemplo, para entender o que aguça a curiosidade delas, determinando quais filmes poderiam fazer mais sucesso.

Monitorar o comportamento de crianças poderá também criar movimentos em que a diversidade de visão do mundo seja comprometida. Evoluir significa se colocar de maneira empática em relação ao que é diferente. Valores monolíticos produzem sociedades monolíticas. Personagens ditando regras podem ser um risco, que já é discutido pelos adultos. Mas no mundo maravilhoso infantil, encontrar um refúgio em um personagem que conduz os pensamentos pode maravilhar em um primeiro momento. As consequências podem ser desastrosas. E isso, creiam, não é brincadeira.

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