‘não há o que comemorar’ – Brasil de Fato

O Instituto de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos do Rio Grande do Sul (IPE Saúde) concluiu, no dia 30 de maio de 2025, um importante acordo judicial com 15 hospitais e quatro entidades representativas de servidores públicos. O impasse, em negociação desde março de 2024, tratava das regras de remuneração aos prestadores de serviço. A repactuação homologada compromete os hospitais a permanecerem no sistema por pelo menos 270 dias e reconhece a legalidade de normas de 2024 que modificam o modelo de pagamento por diárias e taxas hospitalares.

Apesar da celebração por parte do governo estadual, entidades sindicais alertam que o pacto não resolve os problemas estruturais do IPE. “A homologação deste acordo significa a retomada dos serviços. Somente isto. Não vamos nos iludir”, afirma Érico Corrêa, presidente do Sindicaixa. Para ele, o sucateamento segue inalterado, com perdas salariais profundas, evasão de servidores e falta de valorização. “A essência é a questão dos salários. Afinal, as perdas acumuladas dos servidores, quase 80% em 10 anos, são também do IPE Saúde”, complementa.

Déficit, perda de receita e concentração hospitalar

O histórico do IPE nos últimos anos revela uma crise crônica. Criado em 1931, o instituto passou por diversas reformulações até se tornar autarquia independente em 2018. Desde então, enfrenta déficit recorrente. Em 2022, o rombo foi de R$ 440 milhões. Parte do problema decorre da defasagem salarial dos servidores, cuja contribuição ao plano é de 3,1% a 3,6% dos vencimentos. Segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o IPE deixou de arrecadar R$ 105,7 milhões em 2022 apenas por conta da falta de reposição inflacionária.

Corrêa afirma que o mercado de saúde suplementar no Rio Grande do Sul tornou-se altamente concentrado. “O sistema está quase todo na mão de grandes conglomerados”, pontua sobre a crescente influência de interesses privados nos hospitais que compõem a rede.

Retomada parcial

Atualmente, cerca de 300 hospitais e clínicas estão credenciados ao IPE Saúde, mas o número de estabelecimentos efetivamente ativos varia conforme repasses e conflitos contratuais. A adesão recente dos 15 hospitais representa uma retomada parcial, ainda distante da plena cobertura necessária.

O Relatório de Gestão Anual de 2023 do IPE Saúde informa que, em 2023, o IPE atendia a mais de 900 mil usuários em todo o estado. Este número engloba todos os beneficiários dos diversos planos oferecidos pelo instituto, incluindo servidores estaduais (ativos e inativos) e seus dependentes, além de beneficiários de planos complementares, optantes e usuários vinculados por contratos com outros órgãos (como prefeituras e câmaras).

Especificamente em relação ao plano principal, majoritariamente composto por servidores públicos estaduais e seus dependentes diretos, o relatório de 2023 menciona que havia 608 mil segurados vinculados a este plano. Desses, em 2023, apenas 345 mil (cerca de 56,8%) contribuíram financeiramente de forma direta para o plano naquele período, antes das mudanças na legislação de custeio que introduziram a contribuição para dependentes.

Governo destaca previsibilidade; sindicatos apontam colapso do modelo

O IPE Saúde publicou uma nota oficial em seu site informando sobre a celebração do acordo. “Resultado de cerca de um ano de estudo, o projeto foi desenvolvido com apoio de uma consultoria especializada e traz como principal mudança o reajuste dos valores de diárias hospitalares, taxas e serviços”, diz trecho do texto.

A Procuradoria Geral do Estado (PGE) considerou o acordo como um passo crucial para garantir a sustentabilidade do sistema, e publicou a mesma nota pública do IPE. “O novo modelo busca alinhar a remuneração aos valores de mercado, baseando-se em indicativos da Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (CAGE) e do Ministério Público (MPRS), com acompanhamento integral da PGE-RS. O objetivo é trazer maior assertividade na apuração de gastos e previsibilidade nos pagamentos”, afirma.

Por outro lado, a presidenta do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers), Rosane Zan, denuncia que o colapso do IPE Saúde é reflexo do desmonte do serviço público. “Os servidores da educação, que dependem fortemente do plano, passaram a pagar mais. A alíquota subiu de 3,1% para 3,6% e os dependentes também passaram a contribuir. Mesmo com superávit financeiro, o atendimento segue precário, especialmente no interior, onde faltam especialistas”, critica.

Mobilização continua: servidores prometem novos atos

As entidades que representam o funcionalismo estadual seguem em estado de mobilização. A Caravana da Frente dos Servidores Públicos vai percorrer os municípios de Santa Maria, Passo Fundo, Pelotas e Santo Ângelo. “Estamos participando deste ato público regional pois temos pautas comuns, como a reposição salarial de 12,14% e a reestruturação do IPE Saúde. Nos últimos anos, especialmente no governo de Eduardo Leite, o IPE foi sucateado. Essa mobilização é também um enfrentamento às políticas de ataque do governo”, denuncia Zan.

Um novo ato estadual está sendo para o julho. “Seguiremos vigilantes. O governo se obrigou a responder à mobilização. O reajuste entrou na pauta. Este é um ótimo sinal, mas ainda é insuficiente. No dia 11 de julho queremos organizar outro grande ato estadual, ainda maior, certamente”, reforçou Corrêa.

O Brasil de Fato enviou email para o IPE Saúde solicitando posicionamento sobre as denúncias dos servidores. O espaço permanece aberto para declaração.

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