PF diz que acompanha com preocupação alterações do relator no Projeto Antifacção
Integrantes do governo federal, da Polícia Federal e do Judiciário avaliam que as mudanças feitas pelo relator Guilherme Derrite (PP-SP) no Projeto Antifacção vão retirar da PF e dos tribunais superiores a condução de investigações envolvendo emendas parlamentares, lavagem de dinheiro e fluxos financeiros ligados a facções — inclusive as chamadas facções de colarinho branco.
O diagnóstico é compartilhado por diferentes alas do Executivo e por delegados da PF que analisaram o texto revisado após negociação entre Derrite e o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Apesar do aceno público de que o relatório seria ajustado para restaurar a autonomia da PF, a avaliação interna é de que o texto continua restringindo a atuação do órgão e abre caminho para deslocar casos sensíveis para a Justiça estadual, longe do STJ e do STF.
Para Derrite, o debate está tomado por “ideologia política”.
“Estamos discutindo aqui o sexo dos anjos. Primeiro, precisa ler o relatório e realmente entender o que está no substitutivo. Acho que tem muita ideologia política e pouco conhecimento sobre o que realmente está no relatório”, afirmou.
O que diz o texto negociado
Pelo esboço mais recente apresentado a integrantes da PF, a redação ficaria assim:
A PF poderá atuar em investigações quando houver matéria de sua competência constitucional, mas:
terá de comunicar as autoridades estaduais quando iniciar apuração por iniciativa própria;
sua atuação não deslocará automaticamente o caso para a Justiça Federal.
A cooperação envolverá:
solicitação da polícia ou do MP estaduais;
atuação própria da PF com aviso prévio às autoridades locais;
A Justiça competente será a estadual, salvo regras específicas de competência federal.
Para delegados e autoridades do governo, isso cria um mecanismo de “travamento”: a PF até poderia investigar, mas sob vigilância e com limitações operacionais, o que inibe a abertura de apurações sigilosas — especialmente em temas sensíveis como o rastreamento de dinheiro público.
Com esse desenho, avaliam integrantes do governo, investigações sobre emendas e contratos públicos que hoje tramitam na PF e chegam aos tribunais superiores poderiam ser deslocadas para a esfera estadual, onde:
o padrão de especialização é menor;
há mais risco de interferência local;
e há histórico de pressões políticas sobre delegacias e MPs estaduais.
Avaliação dentro do Judiciário
Uma fonte do Judiciário que acompanha as discussões classificou o movimento como “uma semi-blindagem”. Essa fonte se lembrou da PEC da Blindagem, que aumentava proteções a políticos, mas acabou não sendo aprovada:
“Tentaram a PEC da Blindagem. Não deu certo. Estão agora em busca de uma semi-blindagem. Querem tirar da PF a investigação do fluxo financeiro e da lavagem das facções. Todas as facções, inclusive as de colarinho branco.”
Para essa autoridade, o texto cria brechas para:
contestar competência;
provocar nulidades;
e questionar decisões que hoje chegam aos tribunais superiores.
“É obviamente inconstitucional”, afirmou.
Fintechs e lavagem
A mesma fonte mencionou que, nos casos de lavagem, os fluxos financeiros de facções e agentes políticos se cruzam, citando episódios recentes envolvendo aeronaves utilizadas em operações ilícitas.
“Como é muito dinheiro, os canais de lavagem se encontram e se complementam. Lembra a história dos aviões? E aí entram as fintechs.”
Segundo essa avaliação, o projeto — tal como está — dificultaria o alcance da PF sobre essas operações estruturadas que envolvem bancos digitais, criptoativos e mecanismos financeiros transnacionais.
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