Para o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o governo Lula (PT) está certo em manter o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mas falhou ao não comunicar previamente a medida à população. Em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, ele afirma que o imposto atinge sobretudo os mais ricos, com pouco impacto na vida da maioria dos brasileiros, e que a gestão federal não deveria recuar.
“Aparentemente sim [o governo vai manter o decreto], porque o aumento do IOF não atinge de forma alguma a maioria dos brasileiros. […] Atinge as classes médias altas e principalmente os ricos”, diz. Para Ramirez, o incômodo da elite econômica e de veículos da grande imprensa está relacionado ao fato de que, ao exigir ajuste fiscal, esses setores se esquivam da própria responsabilidade. “É preciso que essa classe, que chamamos de parasitária, faça pelo menos o mínimo, que é pagar um pouquinho mais de imposto”, defende.
O professor ainda criticou a postura de parlamentares contrários à medida. “Boa parte dos partidos do centrão, sobretudo da extrema direita, que são representantes das elites, agem de maneira hipócrita, cínica. Afinal de contas, os próprios parlamentares não movem um dedo sequer para reduzir os gastos das verbas parlamentares”, compara.
Governo falha “não nos atos, mas na comunicação”
Apesar de considerar a medida acertada, Ramirez apontou falhas na estratégia de comunicação. Segundo ele, o governo deveria ter preparado o terreno antes de anunciar o decreto, como forma de enfrentar a reação dos mercados e da mídia. “O governo tem realizado algumas falhas de comunicação, não nos atos, mas na comunicação. […] Antes de aumentar o IOF, teria sido interessante [o ministro da Fazenda, Fernando] Haddad insinuar isso em entrevistas, redes sociais, exatamente para que esse debate venha à tona”, exemplifica.
O cientista político defende que o Brasil adote práticas inspiradas em outros países da América Latina, como México, Colômbia e Venezuela, onde líderes mantêm diálogo direto com a população, inclusive em transmissões diárias. “O governo Lula também precisa fazer essas articulações. Não se pode baixar um decreto sem antes haver um debate público. É fundamental para que a própria população seja capaz de ouvir todos os lados e perceber que o mercado financeiro não joga ao lado do trabalhador.”
Ramirez reforça que os setores que mais se opõem ao aumento do IOF são justamente os que mais lucram com as crises econômicas. “Tenho certeza que o aumento do IOF não vai deixar essas elites mais pobres. Isso é ganância. […] O mercado não deve ser protagonista, mas um agente coadjuvante do Estado que visa o processo de desenvolvimento do país”, aponta.
Para ouvir e assistir
O BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.