Imagem de carne bovina tirada em La Reja, Argentina.
José Ignacio Pompé/Unplash
As exportações de carne bovina do Brasil para a Argentina dispararam neste ano, segundo dados do Ministério da Agricultura.
De janeiro a outubro, foram vendidas 11 mil toneladas para o país vizinho, volume mais de 20 vezes maior do que as 526 toneladas embarcadas em igual período do ano passado.
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A Argentina não figura entre os principais compradores do Brasil: mesmo com todo o crescimento, a importação pelo país vizinho representa menos de 1% de todo o volume adquirido pela China, maior cliente da carne brasileira, por exemplo.
Mesmo assim, a disparada das vendas chamou a atenção de especialistas ouvidos pelo g1. Eles viram dois motivos para isso: o tarifaço imposto pelos EUA ao Brasil e a queda na produção de carne na Argentina, que vai perdurar. Veja os detalhes abaixo.
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Efeito tarifaço
Segundo analistas, o tarifaço imposto pelos EUA ao Brasil a partir de abril estimulou os argentinos a venderem mais carne para os americanos.
A Argentina é a quinta maior produtora do mundo, atrás de EUA, Brasil, China, Índia.
Com mais exportação para os EUA, os argentinos recorreram à carne brasileira para não desfalcar o abastecimento interno. Afinal, o país vizinho tem o maior consumo de carne bovina por pessoa no mundo.
O gráfico abaixo ilustra esse movimento: o pico na compra de carne brasileira pelos argentinos aconteceu em setembro, um mês depois de Trump aumentar para 50% a sobretaxa para o Brasil, que só foi retirada neste mês de novembro.

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Tarifaço continua para café solúvel, uva, mel e pescados
Queda na produção local
Mas não foram só as tarifas que levaram à disparada das compras pela Argentina.
Elas começaram a alcançar patamares altos ainda em fevereiro, dois meses antes de os EUA anunciarem a primeira taxa que atingiu o Brasil, de 10%.
Segundo o consultor do Safras & Mercados Fernando Henrique Iglesias, o aumento nas compras aconteceu porque a produção argentina diminuiu por causa de secas e de medidas econômicas do governo anterior, que limitaram as exportações do país.
A produção de carne vem caindo nos últimos dois anos na Argentina, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).
A previsão para 2025 é de uma queda de 100 mil toneladas em relação a 2024, o mesmo volume que o país deixou de produzir no ano passado.
“No início desta década, os efeitos do La Niña acabaram afetando a taxa de prenhez das vacas na Argentina. O custo para produzir ficou muito alto e isso acabou gerando um encolhimento de rebanho”, diz Iglesias.
De 2023 a 2025, a quantidade de bovinos na Argentina caiu de 68,8 milhões para 67 milhões, mostra o USDA.
Além disso, medidas econômicas do ex-presidente argentino Alberto Fernandéz, que governou entre 2019 e 2023, influenciaram pecuaristas a diminuírem a produção, diz Iglesias.
Quatro dias depois de assumir o governo, Fernandéz implementou taxas de exportação a diversos produtos agropecuários, inclusive uma de 9% à carne bovina. Mais tarde, em maio de 2021, ele suspendeu as exportações de carne por 30 dias.
Estímulo às exportações
Por outro lado, o atual governo liberal de Javier Milei foi na contramão do antecessor. Ele não somente reduziu a taxa para exportação da carne bovina, como a zerou entre 22 de setembro e 31 de outubro deste ano.
Segundo Thiago Bernardino de Carvalho, responsável pela área de pecuária no Cepea/USP, essas medidas estimularam o aumento das exportações.
“Com a Argentina podendo exportar mais, sobra menos carne no mercado doméstico, o preço sobe e ela vem para mercados como o brasileiro para comprar mais carne”, diz Carvalho.
Contudo, dados da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes e Derivados (Ciccra) mostram que as exportações de carne da Argentina caíram 10,5%, em volume entre janeiro e outubro, em relação a igual período de 2024, puxadas por uma diminuição das compras da China.
Por outro lado, nesse mesmo período, as vendas argentinas para os EUA aumentaram 7,5%, enquanto o Brasil viu o seu comércio com os americanos despencarem com o tarifaço.
Segundo Lygia Pimentel, CEO da consultoria Agrifatto, foi justamente a retirada parcial da carne brasileira do mercado americano que abriu espaço para os argentinos nos EUA.
“Países como Paraguai, Argentina e Austrália, que são grandes produtores e exportadores de carne bovina, têm comprado muita carne do Brasil. Eles pegam a sua própria carne e enviam para os Estados Unidos, e pegam a do Brasil para abastecer o seu mercado interno”, disse Pimentel, antes dos EUA retirarem as sobretaxas de 10% e de 40% sobre a carne nacional, em novembro.
Ela reforça que, dessa forma, o mercado não estava cometendo a prática ilegal da triangulação, que seria, por exemplo, a de comprar a carne do Brasil e enviá-la para um país intermediário para, de lá, exportar para os EUA.
Carvalho, do Cepea, diz que, além de ser um país vizinho da Argentina, o Brasil tem a carne mais barata do mercado internacional, outro fator que explica a opção dos argentinos de complementar o seu abastecimento com o produto brasileiro.
Segundo dados da Agrifatto, enquanto o preço do boi no Brasil está custando, em média, US$ 61, na Argentina, ele chega a US$ 74,8. Já no Uruguai, a cotação alcança US$ 75,7 e, no Paraguai, US$ 64,5.
A compra de carne brasileira pelos argentinos recuou em outubro, na comparação com o pico do mês anterior, mas ainda seguia em um patamar acima de 1 ano atrás (os números de novembro ainda não tinham sido divulgados até a conclusão desta reportagem).
Segundo Iglesias, a tendência é que o Brasil continue aumentando as vendas para a Argentina.
“Como a produção argentina deve ficar deprimida em 2026, isso deve incentivar mais as importações”, diz Iglesias.
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