O grupo Abra, dono da Gol, encerrou na quinta-feira (26) as negociações para a fusão com a Azul e cancelou o acordo de compartilhamento de voos entre as companhias.
O mercado reagiu de imediato: as ações da Azul dispararam 17,1% na sexta-feira, enquanto os papéis da Gol subiram 5,3%. O anúncio põe fim a uma negociação que criaria uma empresa com 60,4% do mercado doméstico brasileiro, de acordo com dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) referentes ao período de 12 meses concluído em agosto.
Três fatores determinaram o fracasso das negociações de fusão Gol-Azul canceladas: descompasso financeiro entre as empresas, pressão política crescente e resistência regulatória do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Descompasso financeiro e estratégico: o fator Chapter 11
O principal obstáculo foi o desalinhamento total de prioridades e cronogramas financeiros. As negociações começaram em janeiro quando a Gol estava em processo de recuperação judicial nos Estados Unidos, por meio do mecanismo conhecido por Chapter 11.
A situação se inverteu rapidamente. A Gol concluiu sua reestruturação em junho, enquanto a Azul ingressou no Chapter 11 americano em maio. Para a Azul, a reorganização financeira tornou-se prioridade absoluta.
As estratégias eram opostas por natureza. A Gol usou o Chapter 11 para captar recursos e reativar aeronaves paradas por falta de manutenção. A Azul optou por uma reestruturação agressiva: planeja reduzir 35% da frota atual para criar uma operação menor, porém mais rentável.
Resistência regulatória e o fracasso do codeshare
A Gol e a Azul enfrentaram o ceticismo crescente da concorrência e do Cade, que cobravam clareza sobre o controle acionário (uma clara resistência do Cade à fusão aérea). O órgão antitruste já cobrara formalização do acordo de compartilhamento e alertara sobre anúncios prematuros de fusões.
Especialistas antecipavam exigências rigorosas de contrapartidas, incluindo devolução de slots aeroportuários e manutenção forçada de rotas regionais deficitárias.
O próprio acordo de codeshare fracassou na prática. O compartilhamento de rotas foi insignificante, segundo fontes do setor. Em setembro, o Cade formalizou reclamação por não ter sido notificado sobre as operações conjuntas.
O impacto do fim da fusão Gol-Azul no setor aéreo
Segundo investidores e analistas, o melhor cenário é ver cada empresa focada em sua própria estratégia de recuperação. A Gol evita assumir novos desafios logo após sair da recuperação judicial, enquanto a Azul ganha tempo para concluir sua complexa reestruturação. Enquanto a Latam aposta em escala e diversificação geográfica, Gol e Azul tendem a priorizar a rentabilidade sobre o volume, concentrando-se em mercados mais lucrativos e reduzindo rotas deficitárias.
A Abra não abandona seus planos de consolidação regional. A holding, que também tem a colombiana Avianca em seu portfólio, considera essencial criar um grupo latino-americano com escala suficiente para oferta pública inicial (IPO) em mercados internacionais. A empresa afirma permanecer “pronta, disposta e disponível” para futuras oportunidades na região.