
Em sessão realizada após um dia de tumulto, a Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira 10, o texto-base do projeto de lei que reduz as penas dos condenados pelos atos golpistas de 8 de Janeiro de 2023 e deve beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foram 291 votos favoráveis e 148 contrários e uma abstenção à proposta, conhecida como PL da Dosimetria, que seguirá para análise do Senado.
O projeto entrou em votação por decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), mesmo após as cenas de violência contra jornalistas e deputados registradas antes da sessão. O episódio ocorreu depois de Glauber Braga (PSOL-RJ), em protesto contra a votação de uma representação que pode cassar seu mandato, ocupar a Mesa Diretora e ser retirado à força por policiais legislativos.
Motta informou no início da tarde que colocaria o tema em discussão. Contudo, aliados e líderes da Casa esperavam um recuo por considerar não haver clima para votar o PL da Dosimetria logo após a confusão. Integrantes do governo Lula (PT) se disseram surpresos com a votação do projeto devido ao fato de que, na noite de segunda-feira, Motta havia se reunido com os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), sem tratar do assunto.
A proposta aprovada nesta quarta foi relatada pelo deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), designado para a função em 18 de setembro com a expectativa de destravar o debate e dar novo fôlego aos trabalhos do Congresso Nacional. No entanto, a disputa entre bolsonaristas e governistas travou o avanço da proposta.
Para tentar contornar as resistências, Paulinho alterou o nome do projeto de PL da Anistia para PL da Dosimetria, defendendo uma revisão das penas, mas sem perdão integral. Isso desagradou a tropa de choque de Bolsonaro, que buscava uma anistia irrestrita para beneficiar o ex-presidente, e fez o projeto emperrar na Casa.
Com a prisão de Jair Bolsonaro, em novembro, o tema voltou à pauta. No último domingo 6, por exemplo, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) condicionou um recuo em sua pré-candidatura presidencial à aprovação da anistia para seu pai. O relator, no entanto, rechaçou a possibilidade de atender ao pleito, em conversa com CartaCapital na segunda-feira.
Em linhas gerais, o parecer de Paulinho propõe reduzir de um terço a dois terços as penas de condenados por crimes contra as instituições democráticas quando forem cometidos em contexto de multidão, desde que o agente não tenha praticado atos de financiamento ou exercido papel de liderança.
Além disso, anula a possibilidade de condenar um mesmo réu pelas práticas de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, somando as penas de ambos os tipos penais. No caso de Bolsonaro, a Primeira Turma do STF aplicou uma pena de 27 anos e três meses de prisão por cinco crimes, entre eles golpe de Estado (oito anos e dois meses de reclusão) e abolição violenta do Estado Democrático de Direito (seis anos e seis meses). Caso o texto de Paulinho prospere também no Senado, contudo, a Corte deverá descartar a sentença por abolição.
Paulinho estima que, conforme as regras atuais, Bolsonaro passaria seis anos e dez meses no regime fechado. A Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, porém, informou ao STF na semana passada que o ex-capitão poderia progredir ao semiaberto — em tese — mais tarde, em abril de 2033.
Ao fazer com que o crime de golpe de Estado “absorva” o de abolição violenta, conforme a lógica de Paulinho, restariam 20 anos e nove meses de prisão para Bolsonaro cumprir. Com isso, seria possível estimar um período de três anos e quatro meses no regime fechado, sustenta o relator.
“Aí, com a remissão de pena, dá dois anos e quatro meses”, vaticinou o deputado, em coletiva de imprensa na terça-feira. Trata-se da possibilidade de um condenado diminuir sua pena por trabalho ou estudo.
Segundo a Lei de Execuções Penais, para que o condenado que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto diminua um dia de sua pena, deverá cumprir 12 horas de frequência escolar — divididas em no mínimo três dias — ou trabalhar por três dias.
Paulinho propõe em seu relatório que a remição ocorra mesmo em regime domiciliar, o que também poderia beneficiar Bolsonaro.
