Nos últimos anos, a rápida adesão a medicamentos à base de GLP-1, como o Ozempic e Mounjaro, provocou mudanças no comportamento de compra de alimentos. Desenvolvidos inicialmente para tratamento de diabetes e obesidade, esses produtos ganharam espaço em usos estéticos e agora impactam diretamente o varejo alimentar.
Consumidores que antes priorizavam snacks ultraprocessados e opções com alto teor calórico passaram a buscar alternativas mais leves. Shakes proteicos, produtos com menos açúcar e refeições com baixo teor de carboidratos se destacam nesse movimento.
Embora o Ozempic não seja o único responsável, a relação entre o avanço desses medicamentos e a transformação no carrinho de compras já é perceptível.
Dados de pesquisas
Um estudo da Universidade de Cornell, em Nova York, mostrou que famílias com pelo menos um usuário de GLP-1 reduziram em até 9% os gastos no supermercado. O levantamento identificou queda de 11% nas compras de salgadinhos.
Outra pesquisa, realizada pela norte-americana Morgan Stanley, indicou que mais de 60% dos consumidores que utilizam Ozempic ou similares diminuíram ou eliminaram doces e sorvetes da rotina alimentar.
Para Fernando Gibotti, VP de Varejo e Indústria da Rock Encantech, “esses números deixam claro que o impacto não está restrito a setores específicos, mas se reflete em toda a lógica de consumo alimentar”.
Resposta do varejo
Segundo Gibotti, “as marcas e os varejistas que desejarem se manter competitivos precisarão acompanhar de perto essas mudanças de hábito”. Ele reforça que a atenção não deve estar apenas na categoria de produtos, mas no acompanhamento do comportamento do consumidor em tempo real.
Para ele, a ciência do consumo deve ser prioridade. “O uso de dados, inteligência artificial, CRM e análise preditiva permite entender padrões e antecipar necessidades”, afirma.
A forma de exposição também é decisiva. De acordo com Gibotti, “estratégias de merchandising, clusters de consumo bem definidos e gôndolas estendidas ajudam o consumidor a encontrar clareza em meio à variedade de opções”.
Ele acrescenta que campanhas de marketing genéricas perdem espaço. “O consumidor atual busca atributos ligados a performance, saúde e confiança científica, e são esses pontos que devem nortear as estratégias das marcas”, completa.
Projeções no Brasil e no mundo
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já exige receita médica para a compra de medicamentos à base de GLP-1. A partir de março de 2026, o Ozempic perderá a patente de exclusividade no Brasil, permitindo a produção de genéricos. A expectativa é de redução de preços e ampliação do acesso.
Segundo Gibotti, “o aumento da concorrência com a entrada dos genéricos deve ampliar o alcance desses medicamentos e acelerar mudanças no consumo alimentar”.
Globalmente, a consultoria Morningstar projeta que o mercado desses medicamentos, que hoje movimenta US$ 50 bilhões, alcance US$ 200 bilhões até 2031.
Para Gibotti, “esse avanço vai consolidar um cenário em que saúde, funcionalidade e propósito se tornam parâmetros centrais de decisão de compra”. Ele conclui que o papel do varejo será “agir de forma proativa, antecipando demandas e oferecendo soluções que estejam alinhadas ao comportamento do consumidor”.