“Será que o bater das asas de uma borboleta no Brasil pode desencadear um tornado no Texas?” Foi assim que o meteorologista Edward Lorenz deu início à sua conferência na Associação Americana para o Progresso da Ciência (AAAS) em 1972.
Lorenz, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), estava desenvolvendo um programa de previsões meteorológicas que incluía diversas variáveis numéricas. Na primeira vez que ele introduziu os parâmetros no computador, colocou todas as variáveis com o número exato com seis casas decimais e obteve uma previsão.
Ele resolveu confirmar seus achados e, na segunda vez, inseriu por engano um dos valores – 0,506127 – como 0,506. Fez então o computador calcular o modelo novamente e saiu da sala por alguns instantes. Ao voltar, descobriu que essa alteração minúscula causou um efeito dramático na previsão meteorológica, alterando-a completamente. Surgia assim a Teoria do Caos, o chamado “efeito borboleta”, demonstração matemática de que uma mínima perturbação no tempo presente pode resultar em alterações dramáticas no futuro.
Mas será que pequenas ações do cotidiano podem mudar nosso futuro tão dramaticamente assim? A Teoria do Caos, na qual filosofia e matemática caminham juntas, revolucionou vários ramos da física, biologia, engenharia, economia, e até da vida em sociedade. A arte apropriou-se da ideia do efeito borboleta. Muitas obras literárias e cinematográficas foram feitas sobre esse tema e, a despeito dos exageros da licença poética, trouxeram reflexões importantes sobre o viver.
Por exemplo, será que se você trocasse aqueles cinco copinhos de plástico usados para tomar café ou água no trabalho e jogado fora por uma caneca reutilizável poderia evitar Alzheimer no mundo futuro? Um copo de plástico leva de 200 a 400 anos para se decompor na natureza. Durante esse processo lento de decomposição, vão surgindo minúsculas partículas, chamadas microplásticos, capazes de penetrar nas nossas células.
Como consequência do aumento crescente do uso de plástico nas últimas décadas, os microplásticos estão presentes em enormes quantidades no ar, na água dos mares e dos rios e no solo. Eles invadem a corrente sanguínea e as vias respiratórias de peixes, aves, gado e da humanidade, podendo chegar ao cérebro, onde causam inflamação das células que sustentam os neurônios, chamadas de micróglia.
Por esse motivo, estão sendo implicados na instalação de quadros de demência, Parkinson e outros distúrbios neurológicos, além de doenças circulatórias, inflamatórias e até cancerígenas. O impacto ainda é maior nas crianças, expostas a esse material desde a vida intrauterina – já se encontrou microplástico até na placenta humana.
A professora Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em parceria com o pesquisador Luís Fernando Amato-Lourenço, da Universidade Livre de Berlim, encontrou fragmentos de microplásticos no bulbo olfatório, região responsável por processar odores no sistema nervoso central, porta de entrada para o cérebro humano. O plástico mais encontrado foi o polipropileno, usado tipicamente em roupas, embalagens de alimentos e garrafas.
“O ingresso dos nanoplásticos pelas vias olfativas é preocupante, devido à capacidade de tais partículas serem internalizadas pelas células e interferir no metabolismo celular”, alerta a doutora Thais. “O risco pode ser maior em crianças com o cérebro em desenvolvimento, com o potencial de causar alterações definitivas na vida adulta.”
O alerta da ciência sobre este e outros impactos da ocupação humana desordenada na Terra tem sido ignorado repetidamente. Este é um convite para pensarmos sobre o nosso efeito borboleta de cada dia. •
Publicado na edição n° 1376 de CartaCapital, em 27 de agosto de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Teoria do Caos’
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.