A condenação que expõe o custo da perseguição institucional – CartaCapital

A condenação do ex-presidente da Funai Marcelo Xavier a dez anos de prisão por perseguição a servidores e lideranças indígenas é determinante no enfrentamento da violência institucional que se naturalizou no Brasil durante o último governo. Pela primeira vez, um alto dirigente público é responsabilizado por usar o poder do Estado como instrumento de coerção e intimidação contra quem agia em defesa da lei e dos direitos humanos.

O caso expõe, com clareza, como a estrutura estatal foi desviada de sua finalidade republicana. Sob o discurso da eficiência e da autoridade, instalou-se um ambiente de medo e submissão. Servidores públicos passaram a ser tratados como opositores, pareceres técnicos foram deslegitimados, investigações manipuladas e vozes críticas silenciadas. Essa lógica foi cultivada deliberadamente para corroer a função pública e transformar o Estado em um mecanismo de fidelidade política.

A sentença da Justiça Federal do Amazonas desmonta essa engrenagem. Reconhece que o uso da máquina pública para perseguir servidores e povos indígenas faz parte de um projeto de poder que violou princípios constitucionais básicos. Ao condenar Marcelo Xavier, o Judiciário afirma o que parecia esquecido: o Estado pertence à sociedade, não a governos. E quando é usado como arma, é a democracia que adoece.

Essa decisão também faz justiça a quem resistiu dentro das instituições. Servidores da Funai e lideranças indígenas suportaram pressões, difamações e isolamento apenas por exercer suas funções com integridade. A condenação representa, em parte, o reconhecimento público da coragem desses profissionais, que mantiveram a ética e o compromisso com o interesse coletivo mesmo diante do risco.

A atuação da Rede Liberdade, ao lado dos advogados que subscrevem este artigo, foi fundamental para que esse processo seguisse até o fim. Atuamos como assistentes de acusação com a convicção de que não se tratava apenas de um caso individual, mas do precedente institucional de que abuso de autoridade e perseguição política são incompatíveis com a democracia. A responsabilização, aqui, não tem caráter de vingança, mas de reconstrução, porque proteger o serviço público é proteger o próprio Estado de Direito.

O País vive um momento de reconstrução ética e institucional. Essa condenação é parte desse processo. O reconhecimento judicial do assédio institucional abre espaço para que outras vítimas denunciem e para que as instituições criem mecanismos eficazes de prevenção. Democracia não se sustenta em silêncio ou medo. Ela exige transparência, limites e coragem para dizer “basta”.

Que este caso sirva de referência. A impunidade não é falha do sistema, é parte do sistema quando não há reação. Romper esse ciclo é tarefa de todos: da Justiça, das instituições e da sociedade civil. A condenação de Marcelo Xavier não apaga os danos causados, mas sinaliza que o País começa a virar uma página. Que ela não seja esquecida.

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