
O ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu nesta quarta-feira 3 a eficácia de todas as leis municipais que criaram loterias próprias ou autorizaram apostas de quota fixa, e determinou o encerramento imediato das operações em curso. A decisão atinge ao menos 5.500 municípios brasileiros e será submetida à análise do plenário da Corte.
São alvos da determinação tanto leis que já estavam em vigor quanto processos de licitação e credenciamento de empresas que vinham sendo autorizadas por prefeituras a explorar as apostas. Municípios e empresas que descumprirem a ordem estarão sujeitos a multa diária de 500 mil reais, enquanto prefeitos podem ser sancionados em até 50 mil.
O magistrado tomou a decisão em uma ação movida pelo partido Solidariedade. Para o relator, permitir que municípios autorizem bets — inclusive empresas não credenciadas pela Secretaria de Prêmios e Apostas, do Ministério da Fazenda — poderia provocar um cenário de “aberração jurídica”, no qual atividades proibidas em âmbito federal estariam “aparentemente autorizadas” por leis municipais.
De acordo com o ministro, cerca de 55 municípios brasileiros criaram suas próprias bets neste ano. Um desses casos é o de Bodó, uma cidade de 2.700 habitantes no interior do Rio Grande do Norte. Lá, pelo menos 38 empresas (uma para cada 62 moradores) obtiveram licença para explorar o serviço ao custo de 5 mil reais. O valor cobrado corresponde a apenas 0,2% da taxa fixada pelo Ministério da Fazenda.
Trata-se de uma “questão endêmica”, disse o Solidariedade, sigla comandada por Paulinho da Força (SP), na representação enviada ao STF. A ação sustenta que as leis municipais usurpam uma competência do Legislativo federal, enfraquecem a ideia de livre concorrência e servem de refúgio às bets que buscam “superar as recentes regulações” promovidas pela União.
No caso potiguar, o partido afirma que a LotSeridó escancarou a “estrutura pública a empresas não autorizadas para, por meio da exploração da loteria municipal, se apropriarem de maneira maquiada de legitimidade por leis municipais, mas ilícita, dos recursos dos cidadãos, ludribriados pela suposta aparência de legalidade conferida pela oferta de supostos serviços públicos” da cidade.
Esse boom, argumentou Kassio, resultou em um “tumulto regulatório”. A decisão também ordena que a SPA/MF, a Anatel e a Associação Nacional de Jogos e Loterias sejam notificadas para colaborar com o bloqueio de sites irregulares.
“O chancelamento dessa sistemática difusa e pulverizada acaba por promover esvaziamento drástico da fiscalização conduzida pelo Executivo federal, bem assim flexibilizar padrões e critérios com o intuito de atrair investimento e arrecadação para o ente e dificultar a uniformização de parâmetros e regras publicitárias e de tutela dos direitos do consumidor e da saúde do usuário”, escreveu o ministro.
