Lula indicou seu velho conhecido Jorge Messias ao STF. Davi Alcolumbre não gostou, pois queria emplacar Rodrigo Pacheco para a vaga. O leitor tem sua opinião sobre cada um dos envolvidos. Independentemente dela, terá de pagar pelas consequências. Sim: pagar.
Não me refiro às consequências de Messias ocupar uma cadeira no Supremo pelos próximos 30 anos. E sim ao troco que Alcolumbre deu em Lula, mas que na verdade recairá sobre o pagador de impostos – desta e das próximas gerações.
O presidente da República formalizou a indicação de Messias na quinta-feira (20). Horas depois, o presidente do Senado anunciou que a Casa votará nesta terça (25) projeto que regulamenta a aposentadoria especial de agentes comunitários de saúde e de combate a endemias. O gesto foi interpretado como retaliação.
A proposta é chamada de pauta-bomba porque impõe aos cofres públicos uma despesa de centenas de bilhões de reais nas próximas décadas.
Se prosperar, os profissionais contemplados poderão se aposentar aos 50 anos (mulheres) e 52 anos (homens), em vez dos 62 e 65 anos exigidos da maioria dos trabalhadores desde a reforma da Previdência de 2019.
O texto ainda resgata benefícios que haviam sido extintos para novos servidores ainda na reforma previdenciária de 2003: aposentadoria integral (equivalente ao último salário) e paridade (reajustes iguais aos da ativa).
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O projeto de lei complementar (PLP) que Alcolumbre quer votar não apresenta estimativa de impacto no Orçamento, nem fonte de recursos. Mas ele é muito semelhante a uma proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada em outubro pela Câmara, cujos efeitos são mais ou menos conhecidos.
O deputado que relatou a PEC da Câmara, Antonio Brito (PSD-BA), falou em gasto adicional de R$ 5,5 bilhões até 2030. O governo calculou ao menos R$ 25 bilhões em dez anos, sem contar eventuais retroativos. O impacto atuarial, no longo prazo, pode chegar a R$ 200 bilhões.
“Não há qualquer ônus para os subentes federativos. Nenhum prefeito e governador pagará nada; estará tudo arcado pela União”, disse Brito no dia da votação, como se a União fosse sustentada por contribuintes de outros países ou planetas.
A bomba lançada pela Câmara e agora por Alcolumbre drena dinheiro que deveria ir para outras áreas, abre um novo buraco nas contas do governo, dificulta o cumprimento das metas fiscais, amplia a dívida pública, ajuda a manter nas alturas os juros que pagamos. Atrapalha a vida de Lula? Pode ser. Mas prejudica muito mais o conjunto da população.
Quando a PEC foi aprovada, o presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que a proposta reconhecia homens e mulheres “que estão todos os dias nas ruas de nosso país, andando de casa em casa, de porta em porta, debaixo de sol e chuva”.
Alcolumbre foi pelo mesmo caminho ao anunciar a votação do PLP. Falou em “homens e mulheres que, todos os dias, enfrentam sol e chuva para assegurar saúde, prevenção e orientação às famílias em cada canto do país”.
O presente que o Congresso quer dar aos agentes comunitários tende a ser só o início. Na prática, abre a porteira para que outras categorias – trabalhem sob sol e chuva ou não – exijam o mesmo.
A Previdência é a maior despesa do governo e a causa principal de seu déficit – sem ela, o Tesouro é superavitário. É a despesa que mais subiu nas últimas décadas e a que mais deve crescer nas próximas.
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O rombo só tem a aumentar, pois a transição demográfica vai diminuir o número de contribuintes (trabalhadores) e aumentar o de beneficiários (aposentados).
O país deveria, portanto, estar discutindo como aliviar o peso que as próximas gerações terão de sustentar. Mas o Congresso faz o contrário. E também o STF, para onde Lula quer mandar Jorge Messias.
Meses atrás, o Supremo derrubou a equiparação das aposentadorias de policiais homens e mulheres. E está prestes a julgar uma série de processos que buscam desfazer outros pontos da reforma da Previdência do governo Bolsonaro.
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