
Nessa corrida, Bauer afirma que os três grandes players, EUA, China e Rússia, buscam garantir sua influência. Porém, ela considera que os EUA estão atrás na disputa.
Ela sublinha que o desequilíbrio ambiental já está desencadeando conflitos e instabilidades políticas, o que explica por que há uma tendência de magnatas de construir bunkers.
“Porque, inclusive, a segurança alimentar da população vai estar em risco. O relatório já bem antigo da FAO, de mais ou menos cinco anos, fala que no mundo mais quente, que tem muito mais carbono, as plantas crescem tão rápido que elas não têm tempo de fazer proteína e carboidrato, ou seja, elas se tornam muito menos nutritivas e isso pode gerar uma onda de fome global”, afirma.
Bauer diz ver indícios de reação do Sul Global a essas tentativas de neocoloniolismo do Norte, apontando o recente referendo feito pela direita no Equador no qual a população recusou o retorno de bases norte-americanas no país.
“O povo disse não, ou seja, o povo já está bem consciente nesse Sul Global dos sistemas de canibalismo que esse capitalismo de extinção dos países do Norte Global fazem. Temos, sim, esperança de que o Sul Global encontre as suas respostas”, afirma.
Segundo a especialista, entre os mecanismos que têm um grande papel nessa busca por soluções próprias do Sul Global estão o BRICS e blocos regionais.
“Caindo esse sistema ONU, que já está disfuncional, como nós vimos na guerra de Gaza e com esses tratados climáticos que não saem do lugar, […] a grande solução vem desses blocos, por meio de sua diplomacia, por meio de suas políticas próprias.”
Oportunidade para dinamizar transição
A exploração da Margem Equatorial paralelo ao discurso de defesa da conservação ambiental não configura um paradoxo do Brasil, segundo avalia à Sputnik Brasil Bernardo Salgado Rodrigues, doutor em economia política internacional e professor adjunto do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IRID/UFRJ).
Para Rodrigues, o que esse cenário configura é “uma oportunidade para dinamizar a transição energética do século XXI”.
“É a lógica chinesa de ‘construir o novo antes de descartar o velho’. Ao invés de visualizarmos a dicotomia entre conservação versus exploração, é importante refletir, dialeticamente, estratégias de financiamento da transição energética futura lastreadas pelas potencialidades energéticas atuais”, aponta o analista.
Ele cita exemplos como a proposta de adicionar US$ 1 (cerca de R$ 5,34) por barril de petróleo para financiamento de políticas de transição energética e a criação de um Fundo Soberano da Margem Equatorial, como proposto pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), visando uma transição energética justa, soberana e popular, conciliando sustentabilidade ambiental com o desenvolvimento econômico e social.
“O paradoxo principal seria a pressão dos países desenvolvidos por metas de descarbonização, enquanto quase metade da população africana não possui acesso à energia básica. Ou seja, antes que haja uma cobrança isonômica das metas de ‘eletrificação verde’, é preciso superar a crise estrutural de energia em determinados países e regiões do mundo.”
Rodrigues acrescenta que, “sem acesso universal à eletricidade, qualquer ‘transição energética’ será apenas um privilégio de poucos”. Ele afirma que a COP30 não será a única oportunidade para o Brasil redefinir seu papel na geopolítica dos recursos naturais, e frisa que “a Amazônia é um dos principais sustentáculos da transição verde no século XXI.”
“E a manutenção da ‘floresta em pé’ é essencial para que suas externalidades positivas sejam efetivadas, tais como serviços ecológicos relacionados às funções do ecossistema, regularização climática, fixação de CO2, recuperação de fertilidade do solo, arrefecimento de cheias e decomposição de resíduos”, completa o especialista.
Ele afirma ainda que o próprio status de fronteira científico-tecnológica da biotecnologia amazônica pode potencializar a produção de fármacos baseados na natureza brasileira e, concomitantemente, preservar o domínio desse rico patrimônio genético nacional.
“Por consequência, é uma impossibilidade a utilização do espaço amazônico de forma racional sem a exploração harmoniosa e que atribua valor econômico à floresta, instituindo uma via de desenvolvimento baseado em ciência, tecnologia e inovação, compreendendo sua complexidade metabólica e utilizando o seu patrimônio natural sem destruí-lo.”
Para o analista, é necessário compreender a transição verde como um investimento no futuro, “uma oportunidade única para tornar o Brasil líder mundial em tecnologias verdes e, por conseguinte, uma superpotência verde”.
Ele observa que a possibilidade de a corrida por recursos naturais resultar em conflitos é real, pois a partir do momento em que eles se tornam campos de atração e gravitação da intervenção humana para exploração sistemática, passam a adquirir uma conotação estratégica.
“A autossuficiência em energia e matérias-primas diminui a dependência de um Estado e pode vir a fortalecer suas capacidades geoeconômicas e geopolíticas, assim como sua ausência pode ensejar conflitos e instabilidades políticas”, explica.
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