Ícone de Busca

Após aprovação unânime na Câmara dos Deputados, o projeto que isenta do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil mensais aproxima o governo de fincar uma de suas principais bandeiras para a disputa eleitoral em 2026. A proposta alivia o IR de quem ganha menos, e em contrapartida prevê uma tributação de até 10% para a alta renda, além de retomar a taxação de dividendos, extinta desde o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Dias antes da votação, o ex-presidente da Câmara e relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), afirmou que havia unanimidade para votar a proposta na Câmara, apesar de ainda ser necessário discutir a restituição para as perdas arrecadatórias de estados e municípios. Aparentemente não era figura de linguagem: a proposta recebeu 493 votos favoráveis e nenhum contrário.

VEJA TAMBÉM:

  • Veja os deputados que garantiram votação unânime da isenção do IR

Em publicação nas redes sociais celebrando a aprovação na Câmara, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reforçou o discurso de que a medida combate a desigualdade social. “Não há desenvolvimento com esse nível de desigualdade. Não há justiça. Começamos e juntos vamos concluir esse trabalho”, afirmou.

A proposta foi primeiramente apresentada em novembro de 2024, após mais de um mês de espera pelo anúncio de um pacote fiscal do governo. Em março deste ano, a matéria finalmente foi encaminhada à Câmara por meio do Projeto de Lei 1087/2025. Foi aprovada a tramitação de urgência e o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), criou uma comissão especial para tratar do tema.

A relatoria ficou com Lira, que fez algumas alterações na proposta, conforme mostrado pela Gazeta do Povo. Na reta final da aprovação, Lira acatou três das cerca das mais de 90 emendas apresentadas e praticamente manteve o texto final da relatoria, que foi aprovado na noite desta quarta-feira (1.º).

Veja os principais pontos da proposta e de que forma irá aliviar ou apertar o bolso do contribuinte:

Isenção de Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil

De acordo com a proposta aprovada na Câmara, quem recebe até R$ 5 mil mensais receberá desconto equivalente a R$ 312,89 por mês, zerando a contribuição ao Imposto de Renda. Contando com o 13.º salário, em um ano, a redução acumulada em comparação com a regra atual chega a R$ 4.067.

Desconto progressivo para quem recebe entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350

As pessoas que recebem entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350 por mês terão um desconto progressivamente menor, ou seja, quanto maior o salário, menor o desconto, até zerar o benefício para quem recebe o valor máximo dessa faixa. A partir desse valor, fica valendo a tabela atual do IR.

Um ponto importante é que a partir de R$ 7.350 não serão adotadas as faixas de isenção e descontos progressivos da nova regra. Ou seja, quem recebe a partir de R$ 7.350 não terá isenção sobre a parcela de sua renda que vai até R$ 5.000, e sim sobre os atuais R$ 3.036 e as respectivas faixas de incidência da alíquota, chegando a 27,5% sobre a fração mais alta da renda.

Como é o IR hoje e como fica com a nova faixa de isenção e desconto

Confira a seguir simulações de como é a cobrança do Imposto de Renda hoje e como fica com a nova regra, considerando a renda bruta mensal do contribuinte e a aplicação do desconto simplificado do IR. Os cálculos foram feitos advogado Alessandro Tortato, mestre em Direito Tributário pela FGV/SP.

  • Renda bruta de R$ 4 mil: IR efetivo de 2,86% hoje (R$ 114,40) e de 0% com a nova regra – economia de R$ 114,40 por mês e de R$ 1487,20 por ano, considerando o 13º salário
  • Renda bruta de R$ 5 mil: IR efetivo de 6,25% hoje (R$ 312,50) e de 0% com a nova regra – economia de R$ 312,50 por mês e de R$ 4.062,5 por ano, considerando o 13º
  • Renda bruta de R$ 6 mil: IR efetivo de 9,57% hoje (R$ 574,20) e 6,58% com a nova regra (R$ 394,80) – economia de R$ 179,40 por mês e de R$ 2.332,20 por ano, considerando o 13º
  • Renda bruta de R$ 7 mil: IR efetivo de 12,13% hoje (R$ 849,10) e 11,47% com a nova regra (R$ 802,90) – economia de R$ 46,20 por mês e de R$ 600,60 por ano, considerando o 13º
  • Renda bruta de R$ 8 mil: IR efetivo de 14,05% hoje (R$ 1.124) e 14,05% com a nova regra (R$ 1.124) – não haverá mudança na tributação

Segundo o diretor de auditoria interna e assuntos regulatórios da Contabilizei, Diego Zacarias dos Santos, com o PL 1087, o desconto não é um valor único, mas um mecanismo de redução aplicado diretamente sobre o Imposto de Renda que seria pago pela tabela antiga.

Ou seja, não corresponde a uma porcentagem fixa, mas sim a uma redução do imposto devido que varia conforme a faixa de renda, podendo ser total ou parcial.

Imposto de Renda Mínimo para rendas acima de R$ 50 mil mensais

A fim de compensar a perda na arrecadação gerada pela isenção de quem recebe até R$ 5 mil, o governo propôs e a Câmara aprovou o Imposto de Renda Pessoa Física Mínimo (IRPFM), para taxar quem recebe mais de R$ 50 mil mensais.

A alíquota é progressiva, iniciando em 0% até 10%, para quem recebe entre R$ 50 mil e R$ 100 mil. Assim, quem recebe R$ 100 mil mensais, teoricamente, irá arcar com a alíquota cheia, chegando à contribuição de R$ 10 mil do IRPFM. 

Contudo, a alíquota não será cobrada caso o IR pago mensalmente já seja maior do que 10%. Na prática, profissionais liberais e quem tem carteira assinada e recebe mais de R$ 50 mil mensais arcam com alíquotas maiores que essa e, por isso, não devem sofrer impactos com a nova regra, que busca taxar rendas ainda não incluídas no cálculo do Imposto de Renda.

Estão isentos do cálculo os valores obtidos com ganhos de capital, herança ou doação e rendimentos recebidos acumuladamente, bem como títulos e valores mobiliários isentos (veja mais adiante), poupança, aposentadoria e pensão por moléstia grave, e indenizações.

Taxação de dividendos acima de R$ 50 mil mensais

Essa é a principal medida compensatória para a perda de arrecadação com o aumento da isenção e dos descontos do Imposto de Renda. Desde 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso, os dividendos — a parte do lucro das empresas que é repartida com os acionistas — estão isentos de tributação.

E aqui não há progressão: será cobrada uma alíquota de 10% de Imposto de Renda, retida na fonte, sobre os dividendos mensais superiores a R$ 50 mil. 

As empresas protestaram contra a medida. A Federação das Indústrias do Paraná (Fiep) afirmou que, com a criação do Imposto de Renda sobre dividendos, o Brasil terá a maior tributação sobre lucro empresarial do mundo, que pode chegar a 40,6%.

Mecanismo redutor para distribuição de dividendos

Inicialmente, em seu relatório, Lira havia retirado o mecanismo redutor da alíquota para dividendos, mas, após demonstração da Receita Federal, retomou a medida, que visa evitar a bitributação.

O mecanismo prevê que, para as empresas em geral, a alíquota final sobre os lucros e dividendos não pode ultrapassar 34%. Para seguradoras, o percentual é de 40% e, para instituições financeiras, de 45%.

Ou seja, se no cômputo anual a alíquota final paga pela empresa (somando a tributação sobre lucros e sobre dividendos) superar esses percentuais, ela terá direito à restituição que, inclusive, poderá ser repassada — no caso dos dividendos — para seus acionistas.

Por essa razão, a retenção na fonte foi criticada pela indústria como uma penalização das pessoas físicas com o objetivo de gerar impacto fiscal para o governo. A Fiep alegou que se trata de um empréstimo compulsório à União, que poderá reter os valores extras por até 17 meses antes que seja feita a restituição.

Isenção de dividendos em 2025

Segundo a nova regra do IR, para que sejam isentos, os dividendos recolhidos em 2025 precisam ser computados e aprovados até 31 de dezembro deste ano, e distribuídos para os acionistas até 2028.

Essa foi uma das emendas aceitas por Lira na última hora. No relatório aprovado pela comissão especial, não havia data limite para a distribuição desses valores.

Assim, se uma empresa fechar o balanço de 2025 em janeiro ou fevereiro do próximo ano, o que não é raro, os dividendos já serão taxados na fonte com a nova alíquota de 10% para os acionistas que receberem mais de R$ 50 mil mensais.

LCI, LCA, CRI e CRA

Lira especificou em seu relatório que os títulos incentivados, como LCIs, LCAs, CRIs, CRAs, FIIs e Fiagros, também ficarão de fora da base de cálculo do imposto mínimo para altas rendas. Ou seja, os rendimentos obtidos com esses investimentos seguem sem entrar no cálculo do Imposto de Renda.

VEJA TAMBÉM:

  • Presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que isenção do IR sempre foi prioridade da sua gestão

    Câmara aprova isenção do IR e taxação de alta renda

  • Veja os deputados que garantiram votação unânime da isenção do IR

Compensação para estados e municípios

A forma de compensar estados e municípios pelas perdas arrecadatórias foi um dos principais pontos de discussão da matéria. Inicialmente, o texto do governo não previa compensação.

Em sua primeira versão, o relatório de Lira apontava que o repasse deveria ser feito via Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Pouco antes da votação, Lira acatou uma emenda que especificou que os repasses seriam trimestrais, no mês subsequente, aos estados e municípios. Segundo relatório da Tendências Consultoria, o texto do relatório de Lira, antes da emenda, garantia a compensação para a União, mas estados e municípios perdiam arrecadação em todos os cenários.

Excedente entrará no cálculo da CBS

A proposta final de Lira aprovada na Câmara estabelece que a União use qualquer excedente de receita obtido com o Imposto de Renda Mínimo como fonte de compensação para o cálculo da alíquota de referência da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), tributo federal criado na reforma tributária sobre o consumo.

Emolumentos e Prouni

Lira ainda acatou outras duas modificações antes da votação. Uma delas determina que as bolsas concedidas por meio do Programa Universidade para Todos (Prouni) serão consideradas como “imposto pago no cálculo da alíquota efetiva das pessoas jurídicas que aderiram ao programa, nos termos do regulamento”.

A outra beneficia titulares de cartórios, ao estabelecer que repasses obrigatórios sobre emolumentos não entrarão na base de cálculo da tributação mínima do IR. Os emolumentos são taxas cobradas pelos cartórios para a emissão de documentos, como certidões e registros de imóveis, entre outros, que são arrecadadas e repassadas para os tribunais de Justiça.

Após aprovação na Câmara, proposta segue para Senado

Segundo Lira, todas as modificações feitas no texto do Projeto de Lei 1087/2025 foram debatidas com a Receita Federal e com o Ministério da Fazenda. O texto ainda pode sofrer alterações durante sua tramitação no Senado — se isso ocorrer, o projeto terá de retornar à Câmara para apreciação final.

Somente depois de ser aprovado no Senado sem mudanças, ou na Câmara após as modificações feitas pelos senadores, a proposta seguirá para sanção presidencial. Antes da votação desta quarta-feira, no entanto, Haddad já havia dito que Lula sancionará a medida ainda em outubro.

Repost

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *