Cúpula de movimentos populares sofre ataque e denuncia avanço da violência política na Colômbia

A Cúpula Nacional Popular da Colômbia sofreu um ataque com bombas caseiras neste final de semana. A organização registrou ao menos sete explosões ao longo do sábado (27), no que foi considerado como uma ameaça às mais de 1,5 mil pessoas de todo o país que participam do evento na Universidade Pedagógica Nacional, em Bogotá. Ninguém ficou ferido.

As explosões começaram às 9h e duraram até 18h. A segurança do evento identificou garrafas plásticas nos locais dos ataques e suspeita que as explosões foram provocadas por bombas de cloro improvisadas. Esses artefatos podem ser enterrados, já que demoram de 2 a 5 minutos até explodir depois que a solução é misturada.

Os ataques foram realizados próximo ao espaço onde foi montada a cozinha da cúpula e às quadras da universidade. Os autores não foram identificados, mas a segurança afirma que as investigações iniciais indicam que as bombas não foram lançadas por algum dos membros das delegações que estão na cúpula.

Cada organização ou coletivo trouxe seu próprio esquema de segurança. A equipe de segurança se organizou para verificar toda a área da Universidade tateando e tentando encontrar não só vestígios de novas bombas, mas também as áreas em que pessoas que não estavam na cúpula puderam circular.

A suspeita é de que a autoria seja de grupos paramilitares ligados ao narcotráfico com atuação em unidades de ensino.

Isabela* é coordenadora de segurança da cúpula. Ela afirmou que há um conteúdo político nos ataques, já que foi realizado durante o encontro de movimentos populares.

“Isso é jogar com o terror contra as pessoas que se organizam e debatem alternativas para a sociedade e como podemos viver dignamente. Esse encontro ataca os interesses privados das pessoas que se beneficiam do capitalismo, da exploração, do narcotrafico. O que buscamos é disputar o sentido comum da segurança. Não é a polícia que vem nos cuidar ao longo dos últimos 60 anos. São as pessoas organizadas”, disse.

O que é a cúpula

A Cúpula Nacional Popular reúne movimentos de 15 cidades colombianas para discutir novos modelos de cidades e alternativas à lógica neoliberal de gestão do território.

O evento foi organizado pelo Congreso de los Pueblos, um dos maiores movimentos colombianos. O grupo propôs às diferentes organizações uma discussão sobre os novos modelos de cidade e alternativas a uma lógica urbana excludente e, a partir disso, construir e disputa.

As organizações discutem ao longo de três dias as demandas da população em cada cidade e levantarão propostas que serão levadas ao governo nesta segunda-feira (29).

A cúpula foi organizada a partir de encontros nas cidades colombianas. Os organizadores entendem que o processo se deu “de baixo pra cima”, com assembleias nos bairros, universidades e comunidades do país.

As delegações trouxeram estudos dos territórios para serem apresentados, além de organizar apresentações culturais na abertura e no encerramento de cada um dos dias da cúpula. Além disso, também participaram da organização da alimentação e da segurança do evento.

Segurança popular

O esquema montado pelos movimentos para fazer a segurança teve como base as Guardas Populares. O conceito tem como base as organizações de defesa indígena e camponesa, que tem como princípio o cuidado comunitário e o conhecimento ancestral.

O conceito foi incorporado por movimentos populares que consideram que esse mecanismo extrapola a ideia de defesa pela violência. A ideia das guardas é reconhecer o território como elemento fundamental para a reprodução da vida e proteger os cidadãos.

O símbolo das guardas é o chamado “bastão de comando”, um porrete com fitas coloridas em uma das pontas. Isabela afirma que essa é a forma que os movimentos têm de “enfrentar o medo”.

“As guardas são a forma que temos para combater a política do medo desses grupos reacionários e se tornou parte dos processos sociais que estão em luta na Colômbia”, reforçou Isabela.

Integrantes das guardas das delegações presentes na Cúpula durante a abertura do evento (Foto: Rodrigo Chagas/Brasil de Fato)

Violência política

O ataque em Bogotá se insere em um cenário de avanço da violência política no país. Mesmo com a política de paz total do presidente Gustavo Petro, os episódios de violência contra lideranças sociais, indígenas, camponesas e de ex-combatentes seguem em patamares altos.

De 2016 a 2024, o Indepaz registrou quase 2 mil líderes sociais assassinados; somente em 2023 foram 188, em 2024 foram 173 e, até agosto de 2025, já passam de 100 casos.

A política de paz total, formalizada pela Lei 2272/2022, abriu negociação com guerrilhas e mecanismos de submissão à Justiça para grupos do crime organizado, mas encontrou entraves jurídicos e políticos. O diálogo com o Exército de Libertação Nacional (ELN) chegou a ter cessar-fogo e participação social, porém entrou em suspensão no início de 2025.

A reconfiguração das dissidências das Farc-EP agravou o quadro: após 2016, frentes regionais se fragmentaram em ao menos quatorze estruturas sob diferentes guarda-chuvas, dificultando qualquer mesa unificada. Em paralelo, disputas entre grupos armados – como no Catatumbo – produziram dezenas de mortes e deslocamentos massivos.

Para organizações populares, a combinação de fragmentação armada, disputa territorial e impasses institucionais esvazia a proteção de lideranças e comunidades.

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